sexta-feira, 24 de junho de 2011

Capítulo 3 - Sinais

- E agora? Qual atitude eu deveria tomar para sair dessa decadência em que me encontro? Por onde eu devo começar? Para onde devo ir? - O silêncio toma lugar em minha sala novamente e percebi que estava sozinho. O ambiente estava escuro, por mais que os raios de luz tentassem transpassar pelas cortinas. A poltrona em que me encontrava sentado parecia confortável e eu não tinha vontade de mexer nenhum músculo sequer. Atentei meus olhos para o copo com whisky que estava em minhas mãos e lembrei-me de algo que Dianna me tinha dito uma vez. De fato a bebida não resolve nenhum problema, apenas nos traz mais alguns quando já estamos sóbrios. Tentei perguntar para mim mesmo porque estava fazendo aquilo então, mas para que encher a cabeça com mais uma pergunta? A única coisa que eu tinha certeza era de que não adiantaria ficar sentado ali, mas de certa forma eu estava apreciando o luto. Podia sentir o ódio dentro de mim e várias idéias obscuras sobre o que eu faria se estivesse cara-a-cara com o assassino de Dianna. Tudo bem, eu nunca fui de apoiar vinganças, mas acho que é normal pensar nisso nesse caso.


Respirei fundo e tomei coragem de me mover. Deixei o copo de whisky na mesinha ao lado e me apoiei nos braços da poltrona para conseguir levantar. Percebi que tinha bebido mais do que pensava e acabei caindo no encosto novamente. Olhei frustrado para o alto e tentei novamente, dessa vez com êxito. Andei lentamente, cambaleando até a janela e puxei um pouco a cortina. Precisava ver o que acontecia lá fora, se estava tudo indo bem, mas não consegui ver muita coisa. A luz do sol, que não estava tão forte, me atrapalhou a visão. Já se passavam bons dias que eu não conseguira ter um cochilo digno pelo menos. Aquele mesmo sonho aterrorizante da noite em que recebi a notícia sobre Dianna ainda estava na minha mente. Resolvi fechar a cortina novamente, já que não adiantaria muita coisa.

Dei alguns passos até o centro da sala e fiquei parado, pensando no que eu faria agora. Não parecia ter muitas opções já que eu já tinha perdido meu emprego também e os familiares iriam ficar fazendo perguntas e mais perguntas sobre o que havia ocorrido. Fui até a mesinha do lado da poltrona e peguei o meu copo de whisky novamente junto ao controle remoto, liguei a TV e sentei-me mais uma vez onde estava. A programação não parecia muito interessante... os telejornais como sempre, falavam da mesma coisa, em geral tragédias. Acabei pegando no sono, algo que eu não conseguia fazer à um bom tempo.

Acordei com um barulho insuportável que vinha na direção da TV, provavelmente ela tinha perdido o sinal novamente. Era uma TV antiga, sempre acontecia da antena se soltar. Ao menos foi o que pude supor pois mal conseguia enxergar algo à não ser um grande embaçado em minhas vistas. Me levantei da poltrona, esfregando os olhos e caminhei lentamente na direção da TV. Desliguei-a e o silêncio voltou à tona. Talvez eu estivesse dormido mais do que pudesse imaginar, pois já não havia mais os raios de luz. Resolvi subir para o meu quarto para ver se conseguiria aproveitar o embalo do sono. Ao menos por lá não haveria algo que me acordasse. Subi as escadas olhando diretamente para o chão, evitando os quadros com momentos felizes entre Dianna e eu. Simplesmente me joguei na cama ao chegar no quarto. Fazia um bom tempo que não sabia o que era estar lá novamente. Tentei evitar por todo esse tempo sentir o perfume que ainda havia nos lençóis. Não lembro que isso possa ter me atrapalhado; pouco tempo depois meus olhos se fecharam novamente, trazendo-me um sono mais pesado e sonhos que eu poderia distinguir bem.


Ela estava mais linda do que nunca! Estava bem e queria falar comigo. No início as palavras engasgaram um pouco, mas aos poucos ela começara a falar. Eu estava um pouco longe, queria tocá-la mas algo me impedia de se mexer.

- Patrick? Patrick? Pode me ouvir? Porque está fazendo tudo isso consigo mesmo? Parece que já se esqueceu da maneira como resolvemos os nossos problemas. E a promessa que tinha me feito de que não colocaria mais nada de álcool na boca, hein? - Ela sorriu de maneira angelical, deixando a cabeça tombar um pouco para o lado e os cabelos cair, cobrindo um de seus ombros. - Não precisa ficar assim, não tem com o que se preocupar, eu estou bem, mas me incomoda saber que você está nessa vida. Volte à trabalhar, retome a sua vida, não quero você preso à coisas que não tem mais volta. Sempre te amei, Patrick!

Por um momento, como um flash, aquela figura angelical se foi e voltou em algo que não conseguia explicar para mim mesmo. Estava branca, a sua pele fria e os olhos assustadores. Sua voz era estranha e parecia acompanhada de uma rouquidão.

- Mas descubra por si só quem foi o filho da puta que fez isso comigo!


No momento em que ouvi essas palavras levei algo que parecia como um choque e que me tirou do sono. Levantei rapidamente da cama, ainda atordoado, como se estivesse sido liberado pela força que me segurava em meus sonhos. Foi terrível vê-la daquele jeito e isso acabou trazendo todas as lembranças dos acontecimentos dos últimos dias. Agarrei em um abajur que estava na mesinha ao lado da cama e joguei-o contra um espelho do guarda-roupas. Os travesseiros foram jogados para todas as direções possíveis, assim como todas as outras roupas de cama também. Socos e pontapés foram compartilhados contra todos os móveis do quarto. Senti minha respiração ficar mais ofegante e fraca depois de um tempo, meu coração pulsava como se fosse pular para fora do meu peito. Daí então não me lembro de mais nada.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Capítulo 2 - Motivos

Patrick Holmes, esse é meu nome. Não tenho muitos amigos para que você possa confirmar a minha identidade por aí, e os poucos que tenho, creio que não falariam tanto assim de mim. Procuro manter um círculo de amizade bastante fechado, por isso eu sei bem com quais pessoas eu posso contar; isso deve ser umas três ou quatro, chutando muito alto. Apenas uma delas sabe da minha história por completo, e acaba me ajudando algumas vezes, mesmo não concordando com o meu modo de trabalhar.

Atualmente moro em Maryland, mas passei a minha vida toda, desde pequeno, morando em lugares diferentes. Lembro-me bem dos locais que marcaram a minha memória, um deles foi Story City, Iowa, onde morei com a minha esposa por quase seis anos. Há propósito, sou viúvo há quase dez anos, quando assassinaram a minha esposa, a doutora Dianna Foster. Nos conhecemos jovens, algo próximo aos vinte e três anos de idade. Tínhamos acabado de terminar a faculdade e por coincidência, estávamos comemorando no mesmo lugar. Ela era uma mulher incrível, diga-se de passagem. Desde o momento que acordava se preocupava com a sua bela aparência. Até hoje não sei porque ela se maquiava tanto, já que tinha uma incrível beleza natural, achei que não precisava apelar para os cosméticos. Era rotineiro... Assim que ela acabava de se levantar, corria até a penteadeira para arrumar seus longos cabelos loiros que chegavam a iluminar aquele quarto escuro de tão brilhantes que eram. Depois disso voltava para a cama para me acordar. Sua voz baixa, quase que um sussurro bem próximo aos meus ouvidos era a melhor coisa pra me despertar. Ao abrir meus olhos ainda podia contemplar, mesmo com a visão um pouco embaçada, aquele largo sorriso. De uma coisa eu não tinha dúvida, ela me amava de verdade. Tínhamos planos de ter filhos, ela prefiria uma garota; algo normal para um casal que está junto há quase seis anos. Estava tudo no momento certo para isso, tínhamos uma economia estável, bons empregos, e um salário que nos deixava mais à vontade quando pensávamos em nosso futuro.

Certo dia, Dianna chega do trabalho mais sorridente do que nunca. Era algo tão espontâneo que nem pude decifrar. Ela pulou em mim, me enchendo o rosto de beijos. A primeira coisa que passou pela minha cabeça era que ela havia ganho na loteria, ou que seu pai tinha morrido e deixado toda a herança para ela. Confesso que esse último desejo era meu; era a forma que brincava com ela quando queria deixá-la mais séria. O velho era gente boa, estava sempre disposto a ajudar. Ainda devo vários favores para ele. Mas enfim... Ela se afastara de mim enquanto eu ainda olhava para ela, sorrindo, mas sem entender muita coisa.

- Parabéns, Papai Patrick - Ela me disse com um sorriso ainda maior.

Logo tive certeza do que ela estava falando; ela estava grávida! Dianna fez alguns exames na clínica que trabalhava e uma de suas amigas constatou a gravidez... Era mais um sonho nosso que vinha a se realizar. Sem dúvida nenhuma Deus era muito bondoso conosco. Ou vinha sendo até então.

Sempre chegava primeiro em casa, então por ironia à maioria dos casais, era eu quem fazia o jantar para a minha mulher. Lembro-me que havia feito o seu prato favorito: Tripoux de Naucelles. Dianna estudou medicina na França por quatro anos antes de nos conhecermos, logo acabou se familiarizando com a gastronomia local. Estava tudo posto a mesa, mas ela não havia chegado. Já eram oito horas da noite, ela já estava uma hora atrasada. Pensei que a culpa pudesse ser do trânsito local, então não me preocupei tanto. Nova horas da noite. Já tinha perdido a conta de quantas amigas eu já havia ligado para saber onde Dianna estava já que ela também não atendia ao celular. Dez horas da noite e eu já estava cansado de tentar telefonemas e coisas do tipo, decidi ir até a rua, fazendo o mesmo trajeto que ela. Nada. Algumas quadras depois, uma delegacia. Decidi por fim fazer um boletim de ocorrência e ir para casa.

Foi a noite mais mal dormida de toda a minha vida, tenho certeza disso. Em meus sonhos Dianna estava vestida de preto e a roupa aparentava estar um tanto quanto suja. Um vestido longo, como o que ela havia usado em seu casamento. Estava com o rosto um pouco sujo de sangue também. Um beco, escuro, as luzes dos postes raramente piscavam revelando a antiga instalação. Ela gritava meu nome, pedia por ajuda, e eu nada podia fazer. Perdi a conta de quantas vezes acordei naquela noite. E assim foram todas as noites, até que de certo modo, algo me tirou essa aflição.

Quinze dias passados e até então não tive notícia de Dianna. Já fazia alguns dias que eu tinha desistido de ir ao trabalho. Já tinha mandado infinitas mensagens para suas colegas e nenhum delas sabiam sobre o paradeiro de Dianna. Ela também não estava aparecendo no trabalho, então as garotas sempre respondiam as mensagens perguntando se eu sabia algo sobre ela. O telefone toca, e como foram nesses últimos dias, eu me atirava à ele, ansioso por alguma notícia. Um homem falava do outro lado, parecia ser um senhor de idade que não tinha muita certeza do que estava falando.

- Boa noite, com quem falo? - Disse o homem.
- Aqui é Patrick Holmes. -Respondi.
- Ahh, senhor Holmes... Por favor, essa é a residência de Dianna K. Foster?
- Sim, ela mesmo! - Respondi mais ansioso do que o comum - Ela desapareceu há alguns dias. Tem alguma notícia sobre ela?
- Bem, meu nome é Andrew Reynolds da delegacia de Ellsworth e creio que tenho algumas notícias que não queira ouvir. Poderia comparecer na delegacia para conversarmos?

Eu já sabia o que ele queria me dizer, já sabia o que ele tinha lá para mim. Nesse momento senti que tudo parou, meus dedos congelaram e eu não sabia o que responder à voz que estava ao telefone. Senti um buraco enorme abrir sobre os meus pés e me puxar para bem fundo. Tudo já estava escuro aos meus olhos. A única coisa que podia sentir movendo-se ainda era o meu coração, completamente acelerado e parecendo que iria sair pela minha boca. Ele bateu forte, descompassado, me trazendo a realidade novamente.

- Senhor Holmes? Senhor Holmes? Ainda está por aí?
- Sim, sim... - Apenas respondi, sem conseguir perguntar mais nada.
- Pode anotar o endereço para que venha até aqui?
- Sim, eu posso.

Cambaleei até a mesa que fica próximo ao telefone. Abri a gaveta tão rapidamente que ela caiu no chão, espalhando todos os papéis e anotações que haviam por lá. Me abaixei e peguei um papel e uma caneta que estavam próximos dos meus pés. Acho que levantei rápido demais, pois a minha cabeça parecia girar.

- Pronto, pode falar. - Eu disse.
- Dewitt Street, 144. Próximo à livraria da cidade.
- Tudo bem, estou indo agora mesmo.
- Lhe aguardo, senhor Holmes.

Ellsworth não ficava muito longe, era algo em torno de seis à oito quilômetros. Eu sabia que não poderia dirigir naquelas condições físicas e mentais em que me encontrava, mas não poderia deixar de saber o que realmente tinha acontecido à minha Dianna. Corri até a cozinha e peguei as chaves que deixava em cima da geladeira. Fui até o quarto e peguei um casaco para me proteger do frio que fazia lá fora e segui em direção a porta. Todo o caminho até Ellsworth foi uma tortura sem igual. Estava pensando no que o policial Reynolds falaria para mim, e assim, me preparava para ouvir a pior das notícias. Lembrei-me várias vezes da felicidade de Dianna ao me contar que estava grávida e todos os planos que havíamos feito depois disso. Senti uma raiva enorme e quase perdi o controle da direção ao menos umas três vezes. Por Deus eu já poderia me sentir mais aliviado por ter conseguido chegar à delegacia local.
Fazia muito frio quando saí do carro, o vento era forte e parecia que cortava o meu rosto. Subi com certa velocidade um lance de escadas que dava para a porta de entrada da delegacia. Mal cheguei ao balcão e a já anunciava para a recepcionista que gostaria de falar com o policial Reynolds.

- Senhor Holmes? - Ela me perguntou na mesma velocidade.
- Isso mesmo. - Respondi prontamente.
- Siga-me. O policial Reynolds estava lhe esperando.

Ela se levantou com demasiada lentidão e me guiou para uma porta que havia próximo à umas prateleiras cheias de pastas e papéis. Seguimos por um corredor que dava para várias salas, aparentemente cada policial  tinha a sua, não devia ter muitas delas, umas oito ou nove. A última tinha uma placa que se destacava um pouco mais que as outras. "Policial Andrew Reynolds". Parecia que ele era o responsável por tomar conta do local. A recepcionista se encostou no batente enquanto eu vinha mais atrás. Percebi que ela assentiu para alguma coisa que o policial Reynolds havia falado e se virou para mim.

- É aqui, senhor. - Disse-me ela ao sair.
- Obrigado. - Respondi.

Ao entrar na sala encontrei um policial vestido com o uniforme da patrulha e mexendo em alguns papéis. Reynolds era alto, da pele escura, e ostentava facilmente toda a responsabilidade que tinha pelo local.

- Senhor Holmes?
- Sim.
- Sente-se por favor.

Puxei uma cadeira e me sentei conforme Reynolds tinha me pedido.

 - Bem, senhor Holmes, a notícia que eu tenho para você não é muito agradável. Recebemos um comunicado da delegacia de Story City dizendo-nos que a sua esposa estava desaparecida, certo? Ehhh, encontramos uma mulher que bate com a nossa descrição e gostaria que o senhor me dissesse se esta é Dianna K. Foster ou não.

Nesse momento Reynolds puxou uma foto de dentro da pasta que havia sobre a sua mesa e entregou para mim. Ainda estava em choque de tanta informação que ele havia me dado e mal podia falar algo. Estendi a minha mão lentamente e peguei a foto. Não tive coragem de olhar no primeiro momento. Desviei meus olhos para o chão. E se Dianna fosse realmente a garota na foto? Concentrei-me, respirei fundo e aos poucos fui guiando meu olhar para a foto. Pude ver o mesmo cabelo loiro, mas seus olhos estavam fechados. Haviam também algumas marcas roxas no rosto e sangue no canto de sua boca. Seus lábios estavam cortados, provavelmente havia sido espancada. Vi duas pequenas pintas no canto de seu pescoço, eram as mesmas que Dianna tinha. Não aguentei. Todo o choro que havia segurado, toda a angústia desses quinze dias agora vinham a tona. Coloquei novamente a foto sobre a mesa de Reynolds.

- É a sua mulher, senhor Holmes? -Reynolds me pergunta com um tom de voz mais suave.

Não consegui respondê-lo. Definitivamente estava tudo acabado, todos nossos planos, sonhos, tudo. Apenas balancei a minha cabeça afirmando uma resposta a sua pergunta. Aquela sensação do buraco negro abaixo dos meus pés voltara novamente e eu não sabia o que fazer. A voz de Reynolds estava distante, falando algumas coisas que mal pude compreender. De repente, todo aquele sentimento que havia dentro de mim muda, parecia ser algo que me dava força agora. Enxuguei minhas lágrimas na manga do casaco, levantei a minha cabeça e respirei fundo.

- Eu gostaria de ver a minha mulher... -Disse entre dentes.
- Não acho que seja tão recomendável assim, senhor. -Respondeu-me Reynolds.
- EU QUERO VER A MINHA MULHER! -Exaltei-me, batendo as punhos fechados contra a mesa.

Reynolds talvez se assustara e concordou em me mostrar o corpo que agora, com toda a certeza, era da minha Dianna. Ele apertou o botão do interfone e chamou a recepcionista até a sala. Reynolds se levantou e seguiu a recepcionista, pedindo para que eu fizesse o mesmo. Andamos mais uma boa parte do corredor, chegando até uma porta de aço. A recepcionista se afastou e Reynolds abriu a porta, pedindo para que eu o seguisse novamente. Havia uma mesa e um corpo, provavelmente já haviam feito a autópsia do corpo.

- O nosso legista terminou o plantão, mas deixou o laudo, senhor Holmes. Pelo que vejo aqui ela sofreu várias escoriações, traumatismos e coisas do tipo. Estava grávida, poucas semanas. E foi encontrado sêmen em suas partes íntimas também. Eu não entendo muita coisa sobre isso, mas... - Disse Reynolds colocando a ficha novamente próxima a mesa onde estava o corpo. Eu apenas levantei a minha mão pedindo para que parasse, afinal, já tinha escutado o bastante.

- Posso ficar um tempo com ela? - Perguntei.

Percebi uma troca de olhares entre ele e a recepcionista, mas no fim os dois saíram do local sem dizer nada. Deixei que o meu choro saísse novamente ao notar que a porta de aço já havia se fechado. Me aproximei do corpo sem vida de Dianna e joguei os braços sobre o mesmo.

- O que fizeram com você, meu amor? O nosso bebê! Conseguiram acabar com duas vidas! Estava indo tudo tão bem! Lembra que já tínhamos até escolhido as roupas do bebê? Azul e verde para um menino ou rosa e lilás se fosse menina... - Eu sabia que gargalhava irônicamente em meio as lágrimas ao relembrar tais coisas - Iríamos nos mudar, não é mesmo? Uma casa maior, mais quartos, seríamos uma família feliz. O que vou fazer sem você agora, Dianna!? O quê!? -Apenas o choro tomava conta agora. Sem mais boas lembranças, sem mais planos. Eu teria de começar tudo novamente e tentar viver normalmente. Seria difícil, eu não podia simplesmente deixá-la ali, sem poder fazer nada.

Arrastei meu rosto até o rosto dela e beijei-a pela última vez.

- Eu te amo. -Sussurrei.

Enxuguei novamente as lágrimas na manga do casaco e me levantei; firme, como sempre me mostrei à ela. Quando saí da sala Reynolds e a recepcionista me esperavam encostados na parede ao lado da porta, aparentemente estavam conversando sobre as rotinas do lugar.

- Senhor Holmes, gostaria que viesse até a minha sala. Tem alguns papéis sobre o reconhecimento que o senhor deve assinar. -Disse Reynolds.

Não tinha muito o que falar sobre isso, apenas assenti. Segui novamente o passo dos dois pelo corredor. A recepcionista seguiu em frente e Reynolds entrou em sua sala. Os papéis já estavam prontos em cima da mesa, possivelmente a recepcionista já tinha ajeitado tudo, apenas faltava a minha assinatura. Passei os olhos apressadamente sobre tudo o que estava escrito, peguei a caneta que estava próximo à mim e assinei. Me levantei e saí ruidosamente, deixando o policial explicando alguns detalhes sobre a investigação que estavam fazendo em cima do caso. Para que eu queria saber dos detalhes sendo que a minha esposa já estava morta?

Passei pela recepção dizendo um "boa noite" em alto e bom som. Desci apressadamente o lance de escadas e entrei no carro novamente. Aliviado de certo modo ao saber o que tinha acontecido com Dianna, mas ainda assim de luto, com raiva, e pronto para tentar consertar as coisas. Seria difícil, claro. Mas acabaria fazendo valer a pena. Por mim, e por ela.

Capítulo 1 - Prólogo

"Antes de tudo, deixe-me dizer-lhe algo, minha jovem... Faça o que for, prometa o que quiser, não adianta, seu segredo não estará a salvo comigo. Não que eu esteja sendo sarcástico ao pensar desse jeito, porém, mais sarcástico ainda não estaria sendo a demora da justiça divina? Sei bem dos seus erros, sei de tudo que vem fazendo... Agradeço por ter confiado em mim e por ter me contado tudo como se fosse o seu melhor amigo. Não diga para mim agora que eu traí a sua confiança... Não tem idéia de quanto isso me parte o coração! Jamais quis machucar-lhe, acredite nisso! Estou apenas lhe ajudando... Estou apenas lhe ajudando a não errar mais, a não magoar mais ninguém e principalmente a não se culpar mais. Prometo que irei fazer de tudo isso o menos doloroso possível. Você não me deve nada pela sua redenção.  Isso, feche os seus olhos e descanse... Não precisa ficar imaginando tudo o que se passou por aqui. Tudo vai ser diferente daqui em diante, tudo. Ninguém mais irá julgá-la ou condená-la por nada. Não vão haver mais ameaças nem humilhações. Feche seus olhos lentamente, senhorita... Lembre-se de coisas boas, tenha o seu descanso. Isso... acalme-se, bela donzela, acalme-se... Deixe levar-se pelo sono... e sonhe com belas coisas..."